Aranha denuncia racismo ao árbitro de Grêmio x Santos; clube gaúcho foi retirado da Copa do Brasil
Foto: Roberto Vinícius/Agência Eleven / Gazeta Press
Com 14 minutos de atraso, a sessão da 3ª Comissão Disciplinar do STJD, tendo o presidente Fabrício Dazzi no comando, iniciou e teve a partida Grêmio x Santos, válida pela Copa do Brasil, como principal julgamento. O artigo 243-G (discriminação racial) foi o principal alvo da disputa dos advogados, auditores e procurador do Tribunal.
Antes de passar a palavra aos envolvidos, o presidente da Comissão Disciplinar revelou que o Grêmio tentou que o julgamento fosse feito a portas fechadas, sem a presença da imprensa, mas ele indeferiu o pedido, assim como o pedido de adiamento do julgamento, sob alegação de que o tempo foi curto para preparo da defesa do clube gaúcho.
O Grêmio estava representado pelos advogados Gabriel Vieira e Michel Assef Filho. A procuradoria apresentou prova de vídeo contendo a entrevista do goleiro Aranha ao programa Fantástico, da TV Globo, e lances do jogo Grêmio x Santos, com os torcedores na grade insultando o goleiro, além de matérias na imprensa com cânticos da torcida.
Os advogados do clube mostraram vídeos institucionais promovidos pelo Grêmio na luta contra o racismo, que começaram em 2005, com depoimento de vários jogadores, como Zé Roberto, Alex Telles, e a repercussão na mídia desta campanha ao longo do tempo. Além disso, a defesa apresentou a campanha “Somos preto, branco e azul”, com imagens de vários jogadores negros que atuaram pelo clube.
O presidente gremista Fábio Koff foi o primeiro a depor na sessão, com um pedido especial aos auditores. “Estou aqui para dizer que a decisão desta tarde terá uma importância história. Ela não se limita aos fatos, mas vai atingir um clube com 111 anos de existência, com uma escolinha de futebol com mais de 1.500 crianças, em sua maioria de cor, a história do clube, com uma estrela na bandeira, a memória do autor do hino do clube (Lupicínio Rodriguez). Em resumo, a pena a ser aplicada deve ter o sentido pedagógico, sem ultrapassar o razoável. O dano pode ser irreparável. Pedi ao presidente da CBF que instituísse o assunto torcida organizada. O Grêmio não esconde atrás de torcedores. Não subsidiamos torcida, não pagamos ônibus para ninguém e nem facilita a vida dela. Faço este sacrifício pessoal e sofro consequências, com ameaças e riscos. Peço que levem em consideração o que o Grêmio faz, sendo percussor nas suas atividades pela integração social”.
A omissão na súmula do jogo quanto à paralisação do jogo, quando o goleiro Aranha chamou a arbitragem para informar o que estava acontecendo, o árbitro Wilton Pereira Sampaio mostrou-se confuso no relato dos fatos e na explicação sobre o adendo feito à súmula.
“Quando me dirigi ao atleta falei para ele que ficasse tranquilo e não fizesse nenhuma atitude irregular e conversei, pessoalmente, com o 4ª árbitro que fosse percebido o que tinha sido relatado, suspenderia a partida. Comuniquei isso ao capitão do Santos, Edu Dracena, este fato. Além disso, pedi a presença do policiamento para que se deslocasse até o local apontado pelo jogador. Eu e os demais integrantes da arbitragem no jogo não presenciamos nada, apenas o relato do atleta. Se tivesse presenciado ou ouvido o coro racista, a partida seria interrompida. Deixei para informar no hotel porque não foi passado nada para mim, muito menos os atletas e dirigentes das equipes. Ao chegar ao hotel, fiquei assustado com o que li na internet e o que vimos nas imagens pós-jogo. Por isso, fiz o adendo via e-mail. No momento que a partida foi paralisada, falei, pelo rádio, com os meus assistentes e todos disseram que não ouviram nada. Não entendo que a mídia seja mais importante que o relato do atleta”.
Entrou em campo, o questionamento do auditor Ivaney Cayres. Duro nas perguntas, ele colocou Wilton Pereira contra a parede para saber os motivos que levaram ele a não citar na súmula original a paralisação da partida. O árbitro, nervoso, tentou explicar.
“Tive acesso à mídia ao chegar ao hotel, vendo as imagens. Dentro de campo, somente um atleta falou. Se vários falassem, isso seria diferente. Relatei o tempo de paralisação e expliquei que o atleta veio até mim, assim como dois jogadores que foram substituídos. Fiz isso no relatório a parte do jogo (neste momento, o presidente Fabrício Dazzi faz sinal para parar o embate)”.
Gremista pede que não generalizem atitude de torcedores contra Aranha
Foto: Luiz Munhoz/Fatopress / Gazeta Pres
O auditor Ivaney foi incisivo ao indagar o árbitro. “Quero mostrar que a mídia não pode ser soberana ou a única maneira de saber dos fatos, apesar de reconhecer a importância que ela tem para o futebol. Não é cabível um adendo porque estamos julgando algo diferente, muito além de um problema médico. Discordo e o texto da lei me possibilita isso. Se não fosse a mídia, esta nojeira não estaria sendo objeto de julgamento. Parabéns a imprensa pelas imagens que foram capazes de elucidar esta questão”.
O sub-procurador geral do STJD, Rafael Vanin, questionou o fato de Wilton Pereira ter relatado a presença de seguranças e dirigentes do Grêmio próximos ao vestiário e não a reclamação do goleiro Aranha, fato que também foi levantado ao assistente Carlos Berkenbrock.
“Temos a orientação em prestar atenção, ao redor, em tudo que acontece para passar ao árbitro. O relato do goleiro foi sobre algo que já tinha ocorrido. A partir deste momento, nada novo aconteceu. Não tivemos a percepção de ver o que aconteceu. Pela distância que estávamos ficava difícil ouvir algo. Tivemos certeza, através da imprensa, sobre o que tinha ocorrido. Achamos por bem, como Estatuto do Torcedor nos permite, que fizéssemos o adendo. Fizemos a leitura labial, através das imagens, o ato racista. Só podemos relatar o que vimos. O adendo faz parte do Estatuto do Torcedor. Por várias vezes, o atleta relata que levou um soco ou uma cotovelada e não relatamos porque não vimos. Quando não presenciamos, não relatamos”, destacou o assistente.
Os auditores estavam insatisfeitos com as explicações apresentadas. “É inadmissível que ninguém da arbitragem ouvisse as ofensas”, frisou o auditor Ricardo Graiche.
“Vimos nas imagens que os torcedores estavam xingando, com o dedo em riste, o que é normal em um campo de futebol, fazendo ofensas, mas se racismo. Naquele momento, não havia mais os atos, pois eles foram anteriores a paralisação”, defendeu-se Berkenbrock.
O auditor Ivaney Cayres quis saber as atribuições dos assistentes no jogo e os motivos que levaram a não relatar o fato na súmula. Mostrando contrariedade com as explicações apresentadas, ele foi duro ao perguntar o assistente: “Não é obrigação sua acompanhar o árbitro sobre o que está acontecendo?”
“O árbitro estava com controle da situação. Estava junto com a arbitragem sobre o que ocorreu no jogo. No vestiário, relatamos tudo que aconteceu na partida e na zona mista até o nosso vestiário. Aliás, não é a primeira vez que isso acontece com a gente. Como ninguém mais comentou sobre o fato que aconteceu durante o jogo, nem o delegado da partida ou policiamento, a gente partiu para o hotel. No caminho, o celular começou a indicar o que tinha acontecido, assim como as imagens que vimos no hotel. Temos uma orientação a seguir que é relatar tudo que vimos. Apenas relatamos o que vimos na mídia claramente (novamente, o presidente faz cara pedindo para encerrar os questionamentos)”.
Decisão do STJD tira o Grêmio da Copa do Brasil por conta de ações racistas de torcedores
Foto: Marcelo Fonseca / Gazeta Press
A sessão foi paralisada, assim como o jogo Grêmio x Santos, por dois minutos. Na volta, o sub-procurador geral da 3ª Comissão Disciplinar do STJD, Rafael Vanzin, assumiu o microfone. Durante a explanação, o presidente da sessão utilizava o celular para redigir algo.
“Em pleno século XXI, temos que debruçar em um caso repugnante como este. O próprio Grêmio confirma a notoriedade ao fato. Estas manifestações racistas devem ser extirpadas da nossa sociedade e do esporte também. Estes torcedores, entre aspas, porque não é uma pessoa de bem. Estes “torcedores” chamaram além de macaco, mas também é possível perceber que o goleiro foi chamado de “negro sujo”, “bando de negro” e os sons de imitação de macaco. Não é a primeira vez que isso acontece na Arena do Grêmio, como já julgado aqui em março, por conta de discriminação ao zagueiro Paulão, do Inter-RS. Na ocasião, o clube foi punido com uma multa no valor de R$ 80mil. Há um recurso dirigido ao pleno do STJD pedindo a redução, mas não houve ainda o julgamento (neste momento, o advogado do Grêmio, Gabriel Vieira, tenta interromper para fazer uma observação, mas o presidente Fabrício Dazzi não aceita e indica que quando fizer a defesa, ele poderia falar sobre o fato). O Grêmio, em nota oficial, corrobora com o fato e confirma as discriminações. Tudo que aconteceu ainda não foi suficiente para que o Grêmio extirpe, de uma vez por todas, este tipo de conduta. O vice-presidente do Grêmio afirmou que não houve nada e que o goleiro estava fazendo uma encenação, contrário ao presidente do clube. Daqui a pouco, ele vai negar que o goleiro Aranha não é afrodescendente. Isso é inaceitável. Estes fatos dos torcedores identificados constam nos autos do processo. ´O direito não se viola pela quantidade, mas pela qualidade da ofensa´, frase de Ruy Barbosa. O filho do atleta mostrou sua revolta com o que vem acontecendo e o goleiro fez o correto, registrando um boletim de ocorrência. O Grêmio tem esta prática e merece a condenação com a aplicação de multa, no valor significativo, exclusão da competição e demais artigos. Os depoimentos dos árbitros foram contraditórios. Uma hora, ele diz que nada foi relatado pelos atletas. Depois, ele diz que ouviu o relato. O árbitro foi extremamente confuso e todos os árbitros merecem a punição. Mostrou total despreparo e cabe envio de um relatório à Comissão de Arbitragem para que estes profissionais passem por um processo de atualização”, explicou Vanzi.
Os advogados do Grêmio tiveram 15 minutos para executar a defesa do clube. “O aspecto midiático foi enorme e o Grêmio não nega os atos. Foram cinco torcedores fazendo a injúria e as imagens mostram isso. Sabendo dos fatos, o Grêmio emitiu uma nota e divulgou nas suas redes sociais para dar notoriedade ao ocorrido. Desde 2005, o clube trabalha forte para que este tipo de coisa não aconteça. Fizemos a campanha “somos pretos, brancos e azuis” para dar um fim a isso. O Grêmio agiu a levou as provas para a Polícia e cabe a ela investigar. O racismo é um problema social, não do Grêmio. Aqui, não temos auditores negros, nem no Pleno. Não façamos do Grêmio de bode expiatório. Jogar o clube e a torcedora na fogueira é muito simples”, destacou Gabriel Veira.
“Punir um clube por conta de quatro ou cinco torcedores é severamente pesado. O Grêmio é um dos poucos clubes que faz campanha contra o racismo e há muito tempo. Este fato não começou agora, mas desde 2005. Agora, a Procuradoria foi enfática e pediu aos senhores (auditores) que o Grêmio seja excluído da competição, mostrando que assim será feita justiça. Ir para a mídia e pedir a exclusão é muito perigoso. O artigo 243-G indica que pessoas vinculadas ao clube possam gerar atribuições ao clube, mas estas não são torcedoras. O mundo real tem fanático torcedor que, ciente deste fato, ele pode vestir a camisa do rival para prejudicá-lo, em momentos rápidos. Para coibir este tipo de atitude é que não se permita a exclusão da agremiação de um clube. O que é extremamente grave 4 torcedores no meio de 30 mil? Qualquer discriminação merece punição grave, por sinal. Não se pode confundir repercussão com extrema gravidade, como quer a procuradoria. Como diferenciar? Foram 4 pessoas no meio de 30 mil. Se fosse a torcida inteira, a história seria diferente. O clube pode ser punido se alguém cometer um ato, desde que este alguém seja ligado ao clube. Torcedor não tem vínculo com o clube. Antes da exclusão, há portões fechados, multas e outros dispositivos. O Grêmio faz campanhas, colaborou com a Polícia e repudiou os atos. A punição faz você repensar se estas campanhas valem a pena. A conscientização do torcedor é com a campanha que vem sendo feita pelo clube”, disse Michel Assef Filho.
Depois de 3 horas e 40 minutos, veio a sentença e a leitura dos votos. O árbitro Wilton Pereira Sampaio ficou o tempo todo de cabeça baixa, como se temesse pelo pior. O assistente Carlos Berkenbrock abandonou a sessão antes de ser lida a sentença.
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Foto: Roberto Vinícius/Agência Eleven / Gazeta Press
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Antes de passar a palavra aos envolvidos, o presidente da Comissão Disciplinar revelou que o Grêmio tentou que o julgamento fosse feito a portas fechadas, sem a presença da imprensa, mas ele indeferiu o pedido, assim como o pedido de adiamento do julgamento, sob alegação de que o tempo foi curto para preparo da defesa do clube gaúcho.
O Grêmio estava representado pelos advogados Gabriel Vieira e Michel Assef Filho. A procuradoria apresentou prova de vídeo contendo a entrevista do goleiro Aranha ao programa Fantástico, da TV Globo, e lances do jogo Grêmio x Santos, com os torcedores na grade insultando o goleiro, além de matérias na imprensa com cânticos da torcida.
Os advogados do clube mostraram vídeos institucionais promovidos pelo Grêmio na luta contra o racismo, que começaram em 2005, com depoimento de vários jogadores, como Zé Roberto, Alex Telles, e a repercussão na mídia desta campanha ao longo do tempo. Além disso, a defesa apresentou a campanha “Somos preto, branco e azul”, com imagens de vários jogadores negros que atuaram pelo clube.
O presidente gremista Fábio Koff foi o primeiro a depor na sessão, com um pedido especial aos auditores. “Estou aqui para dizer que a decisão desta tarde terá uma importância história. Ela não se limita aos fatos, mas vai atingir um clube com 111 anos de existência, com uma escolinha de futebol com mais de 1.500 crianças, em sua maioria de cor, a história do clube, com uma estrela na bandeira, a memória do autor do hino do clube (Lupicínio Rodriguez). Em resumo, a pena a ser aplicada deve ter o sentido pedagógico, sem ultrapassar o razoável. O dano pode ser irreparável. Pedi ao presidente da CBF que instituísse o assunto torcida organizada. O Grêmio não esconde atrás de torcedores. Não subsidiamos torcida, não pagamos ônibus para ninguém e nem facilita a vida dela. Faço este sacrifício pessoal e sofro consequências, com ameaças e riscos. Peço que levem em consideração o que o Grêmio faz, sendo percussor nas suas atividades pela integração social”.
A omissão na súmula do jogo quanto à paralisação do jogo, quando o goleiro Aranha chamou a arbitragem para informar o que estava acontecendo, o árbitro Wilton Pereira Sampaio mostrou-se confuso no relato dos fatos e na explicação sobre o adendo feito à súmula.
“Quando me dirigi ao atleta falei para ele que ficasse tranquilo e não fizesse nenhuma atitude irregular e conversei, pessoalmente, com o 4ª árbitro que fosse percebido o que tinha sido relatado, suspenderia a partida. Comuniquei isso ao capitão do Santos, Edu Dracena, este fato. Além disso, pedi a presença do policiamento para que se deslocasse até o local apontado pelo jogador. Eu e os demais integrantes da arbitragem no jogo não presenciamos nada, apenas o relato do atleta. Se tivesse presenciado ou ouvido o coro racista, a partida seria interrompida. Deixei para informar no hotel porque não foi passado nada para mim, muito menos os atletas e dirigentes das equipes. Ao chegar ao hotel, fiquei assustado com o que li na internet e o que vimos nas imagens pós-jogo. Por isso, fiz o adendo via e-mail. No momento que a partida foi paralisada, falei, pelo rádio, com os meus assistentes e todos disseram que não ouviram nada. Não entendo que a mídia seja mais importante que o relato do atleta”.
Entrou em campo, o questionamento do auditor Ivaney Cayres. Duro nas perguntas, ele colocou Wilton Pereira contra a parede para saber os motivos que levaram ele a não citar na súmula original a paralisação da partida. O árbitro, nervoso, tentou explicar.
“Tive acesso à mídia ao chegar ao hotel, vendo as imagens. Dentro de campo, somente um atleta falou. Se vários falassem, isso seria diferente. Relatei o tempo de paralisação e expliquei que o atleta veio até mim, assim como dois jogadores que foram substituídos. Fiz isso no relatório a parte do jogo (neste momento, o presidente Fabrício Dazzi faz sinal para parar o embate)”.
Gremista pede que não generalizem atitude de torcedores contra Aranha
Foto: Luiz Munhoz/Fatopress / Gazeta Pres
O auditor Ivaney foi incisivo ao indagar o árbitro. “Quero mostrar que a mídia não pode ser soberana ou a única maneira de saber dos fatos, apesar de reconhecer a importância que ela tem para o futebol. Não é cabível um adendo porque estamos julgando algo diferente, muito além de um problema médico. Discordo e o texto da lei me possibilita isso. Se não fosse a mídia, esta nojeira não estaria sendo objeto de julgamento. Parabéns a imprensa pelas imagens que foram capazes de elucidar esta questão”.
O sub-procurador geral do STJD, Rafael Vanin, questionou o fato de Wilton Pereira ter relatado a presença de seguranças e dirigentes do Grêmio próximos ao vestiário e não a reclamação do goleiro Aranha, fato que também foi levantado ao assistente Carlos Berkenbrock.
“Temos a orientação em prestar atenção, ao redor, em tudo que acontece para passar ao árbitro. O relato do goleiro foi sobre algo que já tinha ocorrido. A partir deste momento, nada novo aconteceu. Não tivemos a percepção de ver o que aconteceu. Pela distância que estávamos ficava difícil ouvir algo. Tivemos certeza, através da imprensa, sobre o que tinha ocorrido. Achamos por bem, como Estatuto do Torcedor nos permite, que fizéssemos o adendo. Fizemos a leitura labial, através das imagens, o ato racista. Só podemos relatar o que vimos. O adendo faz parte do Estatuto do Torcedor. Por várias vezes, o atleta relata que levou um soco ou uma cotovelada e não relatamos porque não vimos. Quando não presenciamos, não relatamos”, destacou o assistente.
Os auditores estavam insatisfeitos com as explicações apresentadas. “É inadmissível que ninguém da arbitragem ouvisse as ofensas”, frisou o auditor Ricardo Graiche.
“Vimos nas imagens que os torcedores estavam xingando, com o dedo em riste, o que é normal em um campo de futebol, fazendo ofensas, mas se racismo. Naquele momento, não havia mais os atos, pois eles foram anteriores a paralisação”, defendeu-se Berkenbrock.
O auditor Ivaney Cayres quis saber as atribuições dos assistentes no jogo e os motivos que levaram a não relatar o fato na súmula. Mostrando contrariedade com as explicações apresentadas, ele foi duro ao perguntar o assistente: “Não é obrigação sua acompanhar o árbitro sobre o que está acontecendo?”
“O árbitro estava com controle da situação. Estava junto com a arbitragem sobre o que ocorreu no jogo. No vestiário, relatamos tudo que aconteceu na partida e na zona mista até o nosso vestiário. Aliás, não é a primeira vez que isso acontece com a gente. Como ninguém mais comentou sobre o fato que aconteceu durante o jogo, nem o delegado da partida ou policiamento, a gente partiu para o hotel. No caminho, o celular começou a indicar o que tinha acontecido, assim como as imagens que vimos no hotel. Temos uma orientação a seguir que é relatar tudo que vimos. Apenas relatamos o que vimos na mídia claramente (novamente, o presidente faz cara pedindo para encerrar os questionamentos)”.
Decisão do STJD tira o Grêmio da Copa do Brasil por conta de ações racistas de torcedores
Foto: Marcelo Fonseca / Gazeta Press
A sessão foi paralisada, assim como o jogo Grêmio x Santos, por dois minutos. Na volta, o sub-procurador geral da 3ª Comissão Disciplinar do STJD, Rafael Vanzin, assumiu o microfone. Durante a explanação, o presidente da sessão utilizava o celular para redigir algo.
“Em pleno século XXI, temos que debruçar em um caso repugnante como este. O próprio Grêmio confirma a notoriedade ao fato. Estas manifestações racistas devem ser extirpadas da nossa sociedade e do esporte também. Estes torcedores, entre aspas, porque não é uma pessoa de bem. Estes “torcedores” chamaram além de macaco, mas também é possível perceber que o goleiro foi chamado de “negro sujo”, “bando de negro” e os sons de imitação de macaco. Não é a primeira vez que isso acontece na Arena do Grêmio, como já julgado aqui em março, por conta de discriminação ao zagueiro Paulão, do Inter-RS. Na ocasião, o clube foi punido com uma multa no valor de R$ 80mil. Há um recurso dirigido ao pleno do STJD pedindo a redução, mas não houve ainda o julgamento (neste momento, o advogado do Grêmio, Gabriel Vieira, tenta interromper para fazer uma observação, mas o presidente Fabrício Dazzi não aceita e indica que quando fizer a defesa, ele poderia falar sobre o fato). O Grêmio, em nota oficial, corrobora com o fato e confirma as discriminações. Tudo que aconteceu ainda não foi suficiente para que o Grêmio extirpe, de uma vez por todas, este tipo de conduta. O vice-presidente do Grêmio afirmou que não houve nada e que o goleiro estava fazendo uma encenação, contrário ao presidente do clube. Daqui a pouco, ele vai negar que o goleiro Aranha não é afrodescendente. Isso é inaceitável. Estes fatos dos torcedores identificados constam nos autos do processo. ´O direito não se viola pela quantidade, mas pela qualidade da ofensa´, frase de Ruy Barbosa. O filho do atleta mostrou sua revolta com o que vem acontecendo e o goleiro fez o correto, registrando um boletim de ocorrência. O Grêmio tem esta prática e merece a condenação com a aplicação de multa, no valor significativo, exclusão da competição e demais artigos. Os depoimentos dos árbitros foram contraditórios. Uma hora, ele diz que nada foi relatado pelos atletas. Depois, ele diz que ouviu o relato. O árbitro foi extremamente confuso e todos os árbitros merecem a punição. Mostrou total despreparo e cabe envio de um relatório à Comissão de Arbitragem para que estes profissionais passem por um processo de atualização”, explicou Vanzi.
Os advogados do Grêmio tiveram 15 minutos para executar a defesa do clube. “O aspecto midiático foi enorme e o Grêmio não nega os atos. Foram cinco torcedores fazendo a injúria e as imagens mostram isso. Sabendo dos fatos, o Grêmio emitiu uma nota e divulgou nas suas redes sociais para dar notoriedade ao ocorrido. Desde 2005, o clube trabalha forte para que este tipo de coisa não aconteça. Fizemos a campanha “somos pretos, brancos e azuis” para dar um fim a isso. O Grêmio agiu a levou as provas para a Polícia e cabe a ela investigar. O racismo é um problema social, não do Grêmio. Aqui, não temos auditores negros, nem no Pleno. Não façamos do Grêmio de bode expiatório. Jogar o clube e a torcedora na fogueira é muito simples”, destacou Gabriel Veira.
“Punir um clube por conta de quatro ou cinco torcedores é severamente pesado. O Grêmio é um dos poucos clubes que faz campanha contra o racismo e há muito tempo. Este fato não começou agora, mas desde 2005. Agora, a Procuradoria foi enfática e pediu aos senhores (auditores) que o Grêmio seja excluído da competição, mostrando que assim será feita justiça. Ir para a mídia e pedir a exclusão é muito perigoso. O artigo 243-G indica que pessoas vinculadas ao clube possam gerar atribuições ao clube, mas estas não são torcedoras. O mundo real tem fanático torcedor que, ciente deste fato, ele pode vestir a camisa do rival para prejudicá-lo, em momentos rápidos. Para coibir este tipo de atitude é que não se permita a exclusão da agremiação de um clube. O que é extremamente grave 4 torcedores no meio de 30 mil? Qualquer discriminação merece punição grave, por sinal. Não se pode confundir repercussão com extrema gravidade, como quer a procuradoria. Como diferenciar? Foram 4 pessoas no meio de 30 mil. Se fosse a torcida inteira, a história seria diferente. O clube pode ser punido se alguém cometer um ato, desde que este alguém seja ligado ao clube. Torcedor não tem vínculo com o clube. Antes da exclusão, há portões fechados, multas e outros dispositivos. O Grêmio faz campanhas, colaborou com a Polícia e repudiou os atos. A punição faz você repensar se estas campanhas valem a pena. A conscientização do torcedor é com a campanha que vem sendo feita pelo clube”, disse Michel Assef Filho.
Depois de 3 horas e 40 minutos, veio a sentença e a leitura dos votos. O árbitro Wilton Pereira Sampaio ficou o tempo todo de cabeça baixa, como se temesse pelo pior. O assistente Carlos Berkenbrock abandonou a sessão antes de ser lida a sentença.
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