Fernando Prass é um dos líderes do movimento Bom Senso (foto:Miguel Schincariol/L!Press)
Um dos principais defensores do Profut, a Medida Provisória 671, o Bom Senso F.C. comemorou, por assim dizer, seu primeiro título na última quarta-feira, 5 de agosto.
Com a sanção da presidente Dilma Rousseff, o movimento viu aprovada a lei que exige dos clubes de futebol contrapartidas marcantes para refinanciarem suas dívidas. Em nome do Bom Senso F.C., Fernando Prass, goleiro do Palmeiras, reconhece esta como a “grande vitória” do grupo, ainda que não tenham conseguido um texto final exatamente como gostariam.
– Muita gente critica, aponta falha neste ponto ou naquele, mas para quem não tinha nada, a aprovação da MP é um grande passo, o ponto de partida para algo maior. Claro que, com o tempo, vai demandar ajustes, mas já começa a dar um norte para quem quer fazer as coisas certas no futebol brasileiro, ajuda a separar quem quer e quem não quer fazer direito – analisa.
Nesta entrevista exclusiva ao LANCE!, o goleiro faz um balanço do Profut, confessa as dificuldades e, com a regulamentação por vir, avisa “continuaremos em cima”.
De que forma o Bom Senso avalia a sanção da MP?
Positiva. É uma coisa que, dois anos atrás, nem era discutido no Brasil. Os clubes vivem situação catastrófica porque não tinham qualquer regulamentação de gestão.
Quais são, na opinião do movimento, os principais pontos do texto que podem ajudar, para usar a expressão da campanha de vocês, a tirar o futebol brasileiro do avesso?
O futebol sempre serviu, historicamente, de trampolim para dirigentes. Gente que entrava com a situação financeira ruim e saía com uma bem melhor. Mas o mesmo não se podia falar do clube. Por isso, a responsabilização dos dirigentes e o limite de gastos com o futebol no orçamento, além dos itens que preveem a prestação de contas, têm tanta importância. Representam princípios básicos para uma reorganização financeira que dará frutos em dez, vinte anos.
E quais itens gostariam de ter visto aprovados e, por questões de negociações, abriram mão?
Um item que não entrou como gostaríamos é a democratização da CBF. A entidade até passou a aceitar os clubes da Série B [em seu colégio eleitoral, com poder de votar e decidir, por exemplo, o presidente da CBF], mas ainda não é o suficiente, porque há outros na C, na D e, que, bem da verdade, são a maioria. A CBF tem de governar para todos os clubes, talvez até os pequenos sejam aqueles que mais precisem de ajuda.
O que achou do veto da presidente quanto à porcentagem da cláusula compensatória?
Para o jogador que está hoje em um clube grande, recebendo um bom salário, com contrato longo, a porcentagem da cláusula compensatória não é tão impactante. Agora, se você pegar um atleta que disputou o Paulistão, por exemplo, contratado por apenas três meses, e que acaba mandado embora com um mês e meio, é importante receber o restante de maneira integral. Às vezes não se consegue colocação em outro clube no restante do ano. É um ponto muito complicado. O que a imprensa e a TV vendem é coisa dos grandes astros e campeonatos, mas estes não representam nem 10% da classe. A realidade é totalmente diferente, tem times que nem jogam a Série D…
Nota da redação: Em meados de julho, a coluna De Prima informou que o Bom Senso protocolou pedido ao governo para barrar a cláusula compensatória, que alteraria o percentual a ser recebido pelos atletas em caso de rescisão contratual de 100% para 50% dos salários até o fim do contrato com os clubes.
O Bom Senso espera adesão em massa dos clubes?
Vamos aguardar para ver quais clubes vão aderir, como será criado o órgão independente e como vai funcionar. A hora em que começarmos a entrar na prática, discutindo situações e normas, é que vamos ter o real impacto. Daqui a um, dois anos vamos ter uma noção melhor. De qualquer forma, continuaremos em cima, batalhamos até aqui para isso e continuamos abertos a participar e a dialogar com quem quer que seja.
A CBF estuda entrar com uma ação judicial. Walter Feldman, secretário-geral da entidade, disse em entrevista ao blog do Rodrigo Mattos que a questão da CND “foi visão equivocada, derrota da democracia”.
Quando envolve política é difícil filtrar o que é verdadeiro e o que é jogo. A própria CBF era contra a MP e recentemente comemorou a sua aprovação. Fica difícil entender. Sei é da parte prática. Os clubes têm dívidas, o governo é credor e tem direito a receber. Então, se vai se acertar ajuda, exige-se contrapartida, gestão responsável e profissional.
NR.: Com a MP, os clubes são obrigados a apresentar a CND (certidão negativa de débito) à Receita para poder disputar as competições.
O Bom Senso chegou a pedir a renúncia de Marco Polo Del Nero, em junho, quando estourou o escândalo na Fifa e as prisões, inclusive de José Maria Marin. Como o movimento avalia hoje a entidade e seus dirigentes?
Tem algumas situações que vão se desenrolar naturalmente. Se for comprovado que A, B, C ou D, como aconteceu com Marin, tem de pagar, responder criminalmente, se tiver de ser preso, tem de ser preso. Vamos esperas as definições.
Quais foram as principais dificuldades durante esse processo de negociação e aprovação da MP do Profut? Que obstáculos tiveram de ser superados pelo movimento?
O mais difícil é a parte da política. Você pode ter ideias coerentes, linhas de pensamento corretas, mas quando chega em Brasília e tem de colocar no papel, levar para votação, aí complica. A gente vive para jogar futebol e até reserva tempo para essas questões, mas política não é a nossa área. E lá está cheio de pessoas que fazem sua vida com isso, negociando, definindo acordos. O que temos é a mídia e a opinião pública para pressionar.
Vocês conseguiram o apoio de grande parte da mídia e mobilizaram torcedores a enviarem mensagens ao Congresso. Têm ideia do alcance ou do potencial do Bom Senso como agente mobilizador?
Acredito que o Brasil está começando a acordar. Em termos históricos, comparando com outros países, somos jovens. O povo brasileiro é muito passivo, até acomodado, e isso é ruim. Agora que a crise está batendo na porta parece que as pessoas começam a querer se mexer. E não falo aqui de derrubar governo ou de quebra-quebra, mas de tomar consciência do seu país. As pessoas demoraram para isso, os jogadores também – e ainda estão demorando.
E a atuação do Bom Senso? Também houve desconfiança quando o movimento foi criado.
O Bom Senso foi criado há quase dois anos e conseguiu muita coisa, mas demorou demais para levantar suas bandeiras em prol de melhorias nas condições de trabalho da coletividade. As pessoas, infelizmente, não entendem. Ficam com pé atrás e não acreditam que fazemos o que fazemos sem querer nada em troca, sem levar qualquer vantagem ou para sacanear. Nós não queremos tirar nada de ninguém, só ajudar. É só você olhar a Medida Provisória, que na verdade protege muito mais os clubes do que os jogadores.
Por quê?
Agora, ainda sem a MP, o jogador, se quiser, vai à Justiça penhora renda de partida, estádio, o que for preciso e de alguma forma vai receber. Quem sai prejudicado sempre é o clube. As pessoas estão vendo que mudanças têm de acontecer. Ficamos muito tempo sem discutir nada. Começamos e novas situações apareceram, como a volta da ideia das ligas. Essa safra nova de dirigentes está vendo que precisamos nos mexer, pelo menos discutir. Se pudermos andar todos juntos, melhor.
E qual o balanço que o Bom Senso faz nesses quase dois anos de existência?
Na prática, a MP é nossa grande vitória. Em termos não palpáveis, digamos, esse despertar da contestação. É fácil dizer que os clubes não pagam, vivem quebrados, está tudo uma droga. Criticar todo mundo sabe, mas o importante, como esta-mos fazendo, é buscar as soluções.
Pelas características do movimento, você acha que o Bom Senso se posiciona no campo político à esquerda ou à direita?
Não tem como nos posicionarmos em relação a isso. É um movimento que saiu de uma classe de trabalhadores. É só pensar na religião, cada um tem a sua, temos católicos, evangélicos, muçulmanos, do candomblé, ateus… Nós nos preocupamos em não dar nenhuma conotação política nesse sentido. Durante a campanha política do ano passado recebemos várias mensagens, nos procuraram em busca de apoio e decidimos que, como um movimento de classe, isso não cabia.
É inegável que o movimentoveio para ocupar uma lacuna mal ocupada pelo sindicato dos jogadores. Como é lidar com uma entidade que deveria fazer o que vocês estão fazendo?
Eu posso falar do sindicato que conheço melhor, o de São Paulo. O sindicato paulista chegou a dizer que a MP era um golpe, que só ia ajudar quem tinha condição financeira elevada. No começo do ano emitiram uma nota apoiando o refinanciamento das dívidas dos clubes sem qualquer contrapartida, mas, veja, nenhum atleta foi consultado! O presidente do sindicato (Rinaldo José Martorelli) tomou essa atitude por uma decisão, uma convicção pessoal – e isso é errado. Se os jogadores decidem em assembleia que a fachada do sindicato tem de ser pintada de azul, tem de pintar de azul. O presidente do sindicato não decide nada, tem é de defender a opinião de uma classe. Acredito que ele se perdeu um pouco, poderia ter participado muito mais da MP em vez de se esconder. Nunca quisemos ocupar o espaço de entidade alguma, mas se o espaço não está sendo ocupado, se tem um vácuo, nada mais natural de que movimentos ocupem esse vazio.
Como você, em particular, analisou o comportamento desses grupos nas conversas e negociações? Os dirigentes, por exemplo, demonstram mais respeito ou cuidado ao tratar com o Bom Senso? Os torcedores, de alguma forma, apoiam as causas?
Sofremos muitas críticas no começo, quando ainda eram poucas informações, sem espaço para explicar e divulgar nossas reivindicações. Era difícil. Depois vimos uma repercussão positiva. Quem quis entender nossas propostas, entendeu. Tem alguns que nem a isso se prestam, mesmo com a quantidade de informações que agora divulgamos e disponibilizamos. Ouvimos opiniões absurdas, de quem não quer e não se interessa em entender. Aí não podemos fazer nada.
A impressão é que muitos jogadores ainda têm medo de se posicionar por possíveis represálias de clube, de torcida… O Bom Senso, ainda que indiretamente, parece estar ajudando alguns a adotarem posturas mais firmes, mas ainda é difícil ver comentários mais aprofundados. Por quê?
Desconhecimento. Futebol nada mais é do que uma pequena parte da sociedade. As pessoas falam que os jogos são violentos. O país é violento, não o futebol. Comentam que atleta não tem cultura. O Brasil tem? Somos apenas uma representação menor do todo. Pode sair na rua para perguntar, a maioria não tem a visão correta do que está acontecendo ou opinião formada sobre assuntos importantes do momento. Os jogadores têm condições de ter acesso a muitas coisas, por desfrutarem de uma melhor condição financeira, mas não vão atrás. Acham que têm de jogar, treinar, ir para casa, ver programa de futebol, ler site de futebol, jornal de futebol e se esquece do resto. O futebol nada mais é do que o reflexo de uma sociedade.
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Com a sanção da presidente Dilma Rousseff, o movimento viu aprovada a lei que exige dos clubes de futebol contrapartidas marcantes para refinanciarem suas dívidas. Em nome do Bom Senso F.C., Fernando Prass, goleiro do Palmeiras, reconhece esta como a “grande vitória” do grupo, ainda que não tenham conseguido um texto final exatamente como gostariam.
– Muita gente critica, aponta falha neste ponto ou naquele, mas para quem não tinha nada, a aprovação da MP é um grande passo, o ponto de partida para algo maior. Claro que, com o tempo, vai demandar ajustes, mas já começa a dar um norte para quem quer fazer as coisas certas no futebol brasileiro, ajuda a separar quem quer e quem não quer fazer direito – analisa.
Nesta entrevista exclusiva ao LANCE!, o goleiro faz um balanço do Profut, confessa as dificuldades e, com a regulamentação por vir, avisa “continuaremos em cima”.
De que forma o Bom Senso avalia a sanção da MP?
Positiva. É uma coisa que, dois anos atrás, nem era discutido no Brasil. Os clubes vivem situação catastrófica porque não tinham qualquer regulamentação de gestão.
Quais são, na opinião do movimento, os principais pontos do texto que podem ajudar, para usar a expressão da campanha de vocês, a tirar o futebol brasileiro do avesso?
O futebol sempre serviu, historicamente, de trampolim para dirigentes. Gente que entrava com a situação financeira ruim e saía com uma bem melhor. Mas o mesmo não se podia falar do clube. Por isso, a responsabilização dos dirigentes e o limite de gastos com o futebol no orçamento, além dos itens que preveem a prestação de contas, têm tanta importância. Representam princípios básicos para uma reorganização financeira que dará frutos em dez, vinte anos.
E quais itens gostariam de ter visto aprovados e, por questões de negociações, abriram mão?
Um item que não entrou como gostaríamos é a democratização da CBF. A entidade até passou a aceitar os clubes da Série B [em seu colégio eleitoral, com poder de votar e decidir, por exemplo, o presidente da CBF], mas ainda não é o suficiente, porque há outros na C, na D e, que, bem da verdade, são a maioria. A CBF tem de governar para todos os clubes, talvez até os pequenos sejam aqueles que mais precisem de ajuda.
O que achou do veto da presidente quanto à porcentagem da cláusula compensatória?
Para o jogador que está hoje em um clube grande, recebendo um bom salário, com contrato longo, a porcentagem da cláusula compensatória não é tão impactante. Agora, se você pegar um atleta que disputou o Paulistão, por exemplo, contratado por apenas três meses, e que acaba mandado embora com um mês e meio, é importante receber o restante de maneira integral. Às vezes não se consegue colocação em outro clube no restante do ano. É um ponto muito complicado. O que a imprensa e a TV vendem é coisa dos grandes astros e campeonatos, mas estes não representam nem 10% da classe. A realidade é totalmente diferente, tem times que nem jogam a Série D…
Nota da redação: Em meados de julho, a coluna De Prima informou que o Bom Senso protocolou pedido ao governo para barrar a cláusula compensatória, que alteraria o percentual a ser recebido pelos atletas em caso de rescisão contratual de 100% para 50% dos salários até o fim do contrato com os clubes.
O Bom Senso espera adesão em massa dos clubes?
Vamos aguardar para ver quais clubes vão aderir, como será criado o órgão independente e como vai funcionar. A hora em que começarmos a entrar na prática, discutindo situações e normas, é que vamos ter o real impacto. Daqui a um, dois anos vamos ter uma noção melhor. De qualquer forma, continuaremos em cima, batalhamos até aqui para isso e continuamos abertos a participar e a dialogar com quem quer que seja.
A CBF estuda entrar com uma ação judicial. Walter Feldman, secretário-geral da entidade, disse em entrevista ao blog do Rodrigo Mattos que a questão da CND “foi visão equivocada, derrota da democracia”.
Quando envolve política é difícil filtrar o que é verdadeiro e o que é jogo. A própria CBF era contra a MP e recentemente comemorou a sua aprovação. Fica difícil entender. Sei é da parte prática. Os clubes têm dívidas, o governo é credor e tem direito a receber. Então, se vai se acertar ajuda, exige-se contrapartida, gestão responsável e profissional.
NR.: Com a MP, os clubes são obrigados a apresentar a CND (certidão negativa de débito) à Receita para poder disputar as competições.
O Bom Senso chegou a pedir a renúncia de Marco Polo Del Nero, em junho, quando estourou o escândalo na Fifa e as prisões, inclusive de José Maria Marin. Como o movimento avalia hoje a entidade e seus dirigentes?
Tem algumas situações que vão se desenrolar naturalmente. Se for comprovado que A, B, C ou D, como aconteceu com Marin, tem de pagar, responder criminalmente, se tiver de ser preso, tem de ser preso. Vamos esperas as definições.
Quais foram as principais dificuldades durante esse processo de negociação e aprovação da MP do Profut? Que obstáculos tiveram de ser superados pelo movimento?
O mais difícil é a parte da política. Você pode ter ideias coerentes, linhas de pensamento corretas, mas quando chega em Brasília e tem de colocar no papel, levar para votação, aí complica. A gente vive para jogar futebol e até reserva tempo para essas questões, mas política não é a nossa área. E lá está cheio de pessoas que fazem sua vida com isso, negociando, definindo acordos. O que temos é a mídia e a opinião pública para pressionar.
Vocês conseguiram o apoio de grande parte da mídia e mobilizaram torcedores a enviarem mensagens ao Congresso. Têm ideia do alcance ou do potencial do Bom Senso como agente mobilizador?
Acredito que o Brasil está começando a acordar. Em termos históricos, comparando com outros países, somos jovens. O povo brasileiro é muito passivo, até acomodado, e isso é ruim. Agora que a crise está batendo na porta parece que as pessoas começam a querer se mexer. E não falo aqui de derrubar governo ou de quebra-quebra, mas de tomar consciência do seu país. As pessoas demoraram para isso, os jogadores também – e ainda estão demorando.
E a atuação do Bom Senso? Também houve desconfiança quando o movimento foi criado.
O Bom Senso foi criado há quase dois anos e conseguiu muita coisa, mas demorou demais para levantar suas bandeiras em prol de melhorias nas condições de trabalho da coletividade. As pessoas, infelizmente, não entendem. Ficam com pé atrás e não acreditam que fazemos o que fazemos sem querer nada em troca, sem levar qualquer vantagem ou para sacanear. Nós não queremos tirar nada de ninguém, só ajudar. É só você olhar a Medida Provisória, que na verdade protege muito mais os clubes do que os jogadores.
Por quê?
Agora, ainda sem a MP, o jogador, se quiser, vai à Justiça penhora renda de partida, estádio, o que for preciso e de alguma forma vai receber. Quem sai prejudicado sempre é o clube. As pessoas estão vendo que mudanças têm de acontecer. Ficamos muito tempo sem discutir nada. Começamos e novas situações apareceram, como a volta da ideia das ligas. Essa safra nova de dirigentes está vendo que precisamos nos mexer, pelo menos discutir. Se pudermos andar todos juntos, melhor.
E qual o balanço que o Bom Senso faz nesses quase dois anos de existência?
Na prática, a MP é nossa grande vitória. Em termos não palpáveis, digamos, esse despertar da contestação. É fácil dizer que os clubes não pagam, vivem quebrados, está tudo uma droga. Criticar todo mundo sabe, mas o importante, como esta-mos fazendo, é buscar as soluções.
Pelas características do movimento, você acha que o Bom Senso se posiciona no campo político à esquerda ou à direita?
Não tem como nos posicionarmos em relação a isso. É um movimento que saiu de uma classe de trabalhadores. É só pensar na religião, cada um tem a sua, temos católicos, evangélicos, muçulmanos, do candomblé, ateus… Nós nos preocupamos em não dar nenhuma conotação política nesse sentido. Durante a campanha política do ano passado recebemos várias mensagens, nos procuraram em busca de apoio e decidimos que, como um movimento de classe, isso não cabia.
É inegável que o movimentoveio para ocupar uma lacuna mal ocupada pelo sindicato dos jogadores. Como é lidar com uma entidade que deveria fazer o que vocês estão fazendo?
Eu posso falar do sindicato que conheço melhor, o de São Paulo. O sindicato paulista chegou a dizer que a MP era um golpe, que só ia ajudar quem tinha condição financeira elevada. No começo do ano emitiram uma nota apoiando o refinanciamento das dívidas dos clubes sem qualquer contrapartida, mas, veja, nenhum atleta foi consultado! O presidente do sindicato (Rinaldo José Martorelli) tomou essa atitude por uma decisão, uma convicção pessoal – e isso é errado. Se os jogadores decidem em assembleia que a fachada do sindicato tem de ser pintada de azul, tem de pintar de azul. O presidente do sindicato não decide nada, tem é de defender a opinião de uma classe. Acredito que ele se perdeu um pouco, poderia ter participado muito mais da MP em vez de se esconder. Nunca quisemos ocupar o espaço de entidade alguma, mas se o espaço não está sendo ocupado, se tem um vácuo, nada mais natural de que movimentos ocupem esse vazio.
Como você, em particular, analisou o comportamento desses grupos nas conversas e negociações? Os dirigentes, por exemplo, demonstram mais respeito ou cuidado ao tratar com o Bom Senso? Os torcedores, de alguma forma, apoiam as causas?
Sofremos muitas críticas no começo, quando ainda eram poucas informações, sem espaço para explicar e divulgar nossas reivindicações. Era difícil. Depois vimos uma repercussão positiva. Quem quis entender nossas propostas, entendeu. Tem alguns que nem a isso se prestam, mesmo com a quantidade de informações que agora divulgamos e disponibilizamos. Ouvimos opiniões absurdas, de quem não quer e não se interessa em entender. Aí não podemos fazer nada.
A impressão é que muitos jogadores ainda têm medo de se posicionar por possíveis represálias de clube, de torcida… O Bom Senso, ainda que indiretamente, parece estar ajudando alguns a adotarem posturas mais firmes, mas ainda é difícil ver comentários mais aprofundados. Por quê?
Desconhecimento. Futebol nada mais é do que uma pequena parte da sociedade. As pessoas falam que os jogos são violentos. O país é violento, não o futebol. Comentam que atleta não tem cultura. O Brasil tem? Somos apenas uma representação menor do todo. Pode sair na rua para perguntar, a maioria não tem a visão correta do que está acontecendo ou opinião formada sobre assuntos importantes do momento. Os jogadores têm condições de ter acesso a muitas coisas, por desfrutarem de uma melhor condição financeira, mas não vão atrás. Acham que têm de jogar, treinar, ir para casa, ver programa de futebol, ler site de futebol, jornal de futebol e se esquece do resto. O futebol nada mais é do que o reflexo de uma sociedade.
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